sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Morre Soldado Japonês

Morre soldado japonês que levou 29 anos 
para admitir derrota na guerra


Morreu quinta-feira em um hospital de Tóquio, aos 91 anos, Hiroo Onoda, oficial do Exército imperial japonês.
Ele permaneceu em seu posto na selva, em uma ilha das Filipinas, por 29 anos, se recusando a acreditar que a Segunda Guerra tinha acabado, e voltou ao praticamente irreconhecível Japão em 1974, sendo recebido como herói.
Tudo começou com um simples comando. A última ordem recebida por Onoda no começo de 1945 foi a de permanecer em seu posto e lutar. Fiel a um código militar que ensinava que a morte é preferível à rendição, Onoda, segundo-tenente no exército, ficou para trás na ilha de Lubang, 150 quilômetros a sudoeste da capital filipina Manilha, quando as forças japonesas se retiraram, no momento da invasão norte-americana.
Depois da rendição do Japão, em agosto daquele ano, havia milhares de soldados japoneses espalhados pela China, Sudeste Asiático e Pacífico Ocidental. Muitos desses homens foram capturados ou voltaram para casa, enquanto centenas optaram por se esconder, em lugar de se render ou cometer suicídio. Muitos morreram de fome ou vítimas de doenças. Alguns poucos sobreviventes se recusaram a acreditar nos panfletos lançados de aviões e nos anúncios de rádio que os informavam da derrota japonesa na guerra.
Onoda, um oficial de inteligência e treinado em táticas de guerrilha, e três soldados que estavam com ele encontraram panfletos que proclamavam o fim da guerra, mas acreditavam que se tratasse de um truque de propaganda. Construíram cabanas de bambu; comiam bananas, coco e arroz roubado de uma aldeia; e matavam vacas para obter carne.
Atormentados pelo calor dos trópicos, pelos ratos e mosquitos, eles remendavam seus uniformes e mantinham seus fuzis em condição de operar.
Considerando-se ainda em guerra, eles escapavam às patrulhas de busca norte-americanas e filipinas, e atacavam ilhéus que consideravam ser guerrilheiros inimigos; cerca de 30 moradores da ilha morreram em escaramuças com os japoneses, ao longo dos anos. Um dos soldados da unidade de Onoda se rendeu às forças filipinas em 1950, e dois outros foram mortos em combate contra unidades da polícia local envolvidas em busca pelos renegados, em 1954 e 1972.


O Soldado Onoda

O último remanescente, Onoda que havia sido oficialmente declarado morto em 1959 - foi localizado por Norio Suzuki, um estudante que visitou a ilha para procurar por ele, em 1974.
O tenente rejeitou os apelos do estudante para que retornasse ao Japão, insistindo em que ainda estava à espera de ordens. Suzuki voltou ao Japão com fotos de Onoda, e o governo japonês enviou uma delegação à ilha, incluindo o irmão do tenente e seu antigo comandante, para encerrar formalmente a sua missão.
Em Manilha, Onoda, ainda usando os restos de seu uniforme, entregou sua espada a Marcos, que o perdoou pelos crimes cometidos durante o período em que ele continuou acreditando estar em guerra.
"Tive a sorte de poder me dedicar ao dever durante meus anos de juventude e de maior vigor", ele afirmou. Perguntado sobre seus pensamentos durante todos aqueles anos na selva, ele respondeu: "Pensava só em cumprir meu dever".
Depois da recepção calorosa que recebeu no Japão, Onoda foi examinado por médicos, que o encontraram em estado de saúde espantosamente bom. Ele recebeu uma pensão das forças armadas e assinou um contrato de US$ 160 mil para publicar suas memórias, "Sem Rendição: Meus 30 anos de Guerra", escritas por um ghost writer. Sua história ganhou circulação mundial em livros, artigos e documentários, mas Onoda decidiu tentar levar uma vida normal.
Ele saía para dançar, aprendeu a dirigir e viajou pelas ilhas japonesas. Mas era um homem sem raízes, em um país desconhecido, desiludido com o materialismo e incapaz de aceitar as mudanças. "Há tantos edifícios e automóveis em Tóquio", ele disse. "A televisão pode ser conveniente, mas não tem influência sobre minha vida aqui".
Em 1975, ele se mudou para uma colônia japonesa em São Paulo, Brasil, e se tornou pecuarista; em 1976, Onoda se casou com Machie Onuku, que ensinava como realizar a cerimônia de chá tradicional japonesa. Em 1984, eles voltaram ao Japão e fundaram a Escola Onoda de Natureza, um acampamento que ensina aos jovens como sobreviver na natureza. Em 1996, ele revisitou Lubang e doou US$ 10 mil a uma escola da ilha.
Nos últimos anos, ele dividiu seu tempo entre o Japão e o Brasil, do qual se tornou cidadão honorário em 2010.
Hiroo Onoda nasceu em 19 de março de 1922, em Kainan, Wakayama, no centro do Japão, um dos sete filhos de Tanejiro e Tamae Okoda. Aos 17 anos, começou a trabalhar para uma companhia de comércio em Wuhan, China, que havia sido ocupada pelas forças japonesas em 1938.
Em 1942, se alistou no exército japonês, no qual foi selecionado para treinamento especial, e estudou na Escola Nakano, o centro de treinamento do Exército para seus oficiais de inteligência. Ele estudou guerrilha, filosofia, História, artes marciais, propaganda e operações clandestinas.
No final de dezembro de 1944, foi enviado a Lubang, uma ilha estratégica de 25 quilômetros de comprimento por 10 quilômetros de largura no acesso sudoeste à baía de Manilha e à ilha de Corregidor, com a missão de sabotar as instalações portuárias e uma pista de pouso, a fim de prejudicar a iminente invasão norte-americana. Mas os oficiais superiores presentes na ilha revogaram essas ordens e concentraram suas atenções nos preparativos para a evacuação da guarnição japonesa.
Quando as forças norte-americanas desembaraçaram em Lubang, em 28 de fevereiro de 1945, e os últimos japoneses fugiram ou foram mortos, o major Yoshimi Taniguchi deu a Onoda suas ordens finais, de ficar na ilha e lutar. "Pode demorar três anos, pode demorar cinco anos, mas não importa o que aconteça voltaremos para resgatá-lo", o major prometeu.
Passados 29 anos, o major reformado, que depois da guerra se tornou livreiro, retornou a Lubang a pedido de Tóquio, a fim de cumprir a promessa. O Japão havia perdido a guerra, e a missão do tenente estava encerrada. O esfarrapado oficial fez uma saudação formal, e chorou.

Fonte: Folha de São Paulo edição de 17/01/2014

Forte Abraço!
Osmarjun

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